O poeta adormeceu...
No passado dia 13, o sono profundo tomou conta de Eugénio de Andrade, um amante da palavra, incansável explorador da perfeição que tentava conseguir nos seus versos... o que diversas vezes aconteceu.
"Não houve Mozart no funeral de Eugénio. Nem Chopin. Nem Schumann. Nem silêncio. Nem a brevidade nascida da urgência de tapar a nudez dos sentimentos. Todas as palavras são desnecessárias quando sobra a dor para escurecer os antes luminosos dias.
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Entre os poetas, foi dos maiores da língua portuguesa. Nunca concorreu a prémios e, no entanto, foi muito premiado. Não desdenhava distinções, mas jamais usou qualquer das insígnias ou condecorações recebidas. Mesmo se há quem o considere «o» poeta, essa será uma discussão irrelevante e desnecessária, em particular quando se constata não haver outro tão traduzido em tantas línguas, desde o servo-croata ao chinês, do japonês ao basco.
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Deixava-se prender por detalhes. Seduziam-no os instantes fugazes susceptíveis de, na sua simplicidade, esconderem mundos inimagináveis. Por isso dizia que a pureza de que tanto se fala, a propósito da sua poesia, era «simplesmente paixão pelas coisas da terra, na sua forma mais ardente e ainda não consumada». Paixão pelo que pode haver de sublime no mais silencioso dos gestos.
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Não há palavras interditas para quem ama. Não há gestos proibidos para quem sofre."
in Única - Expresso 18/06/2005 - Excertos do texto de Valdemar Cruz
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